segunda-feira, 30 de abril de 2012

Do que eles gostam?

Por Caroline Bittencourt

Quando eu estava grávida do Lucca, preparei o quartinho dele com o tema ‘fundo do mar’. Tudo azul, com golfinhos, peixes e tubarões. Como não gostar de golfinhos? Acontece que ele nem tchum pros bichinhos. O negócio dele eram ‘bichos’ com motor, principalmente carros. A bolacha maria às vezes servia de direção, outras vezes de roda. Mal sabia falar, e já perguntava mil vezes por dia: “que carro é aquele?”. Na época, eu tinha um corsa, e não sabia identificar mais do que dois ou três modelos além do meu. E aí, como faz pra responder? Lendo o nome na traseira, no meu caso. De vez em quando eu chutava pela marca, mas foi ficando cada vez mais difícil enrolar. “Não, mãe, não é um vectra, é um astra sedan, mas com roda de vectra” .

Qualquer saída era pretexto pra comprar um hot wheels. Não quero escândalo no restaurante? Passadinha antes na loja de brinquedos. Carrinho novo na mão era garantia de paz. Com o tempo, eu já parava pra olhar os carrinhos até quando ele não pedia, já sabia os modelos que ele tinha e procurava novidades. Só não podia comprar os cor de rosa, ‘de menina’. Opa, de menina? Então eu quero! Comecei minha própria coleção. Modesta perto da dele, claro. Tenho hoje uns vinte e poucos, todos ‘de menina’.

Acontece que a vida vai apresentando coisas novas pros nossos pequenos, e aqueles interesses que pensávamos que durariam pra sempre vão dando lugar a outros. Chegou uma hora que eu queria entrar nas lojas pra olhar carrinhos e ouvia “chega, mãe, já temos muitos”.

Lá pelas tantas, o colégio onde o Lucca estudava passou a oferecer aulas de skate. Adorou a ideia. Finalmente poderia participar de alguma escolinha, já que a de futsal estava fora de cogitação pra ele, que nunca gostou de futebol. Virou skatista. Cabelo passando os ombros, roupas largas. De tanto ele insistir, nos associamos no clube que tinha uma pista com bowl (sim, como o de servir salada). Íamos à noite. Enquanto ele suava no tal bowl, eu suava na pista de atletismo. Fora as muitas horas na internet vendo videos de skate pra tentar reproduzir as manobras depois.

No último dia de aula no último ano naquele colégio, além do lanche coletivo de despedida, os alunos podiam levar um briquedo. Óbvio que o Lucca levou o skate. E, pela primeira vez, caiu do skate. E foi feio, quebrou o braço. Hospital, muita dor, dois meses de gesso, bem nas férias. Sem skate, sem piscina, sem correr. Muita gente dizendo que eu tinha que ‘proibir o skate, esconder, imagina só o perigo, que horror’. Como assim? E quando tropeçar na rua, não deixo mais sair de casa? E quando tomar um fora da namorada, proíbo de namorar? Não, senhor, a vida é assim, a gente tropeça e levanta pra cair de novo. Mas não adiantou todo meu estímulo. Desde que tirou o gesso, não quis mais saber do skate. Pelo menos aceitou cortar um pouco o cabelo.

No tempo que ficou de molho, o que sobrou? Os vídeos de skate. E a trilha sonora dos videos. E as bandas que tocam aquelas músicas (‘mãe, tu sabia que o Dave Grohl, vocalista e guitarrista do Foo Fighters, era baterista do Nirvana?’). E a guitarra que o vô deu no Natal. E uma vontade enorme de fazer escolinha de guitarra. Ou bateria, tanto faz.


Natal de 2011. Cabelão, braço quebrado e guitarra nova


terça-feira, 17 de abril de 2012

Branca de Neve

Por Daniela C

Final de semana passado fomos ao casamento de um casal de amigos. Levei minha pequena de quase três aninhos, e ela deu um show, de dois atos. O primeiro ato foi a trabalheira sem fim, pega a menina que está correndo para onde não deve, que está derrubando os enfeites das mesa, que está chorando enquanto o padre fala, que não quer comer, que sujou o vestido inteiro de pólen daquelas florzinhas amarelas de mato: foi para o jardim, recolheu umas vinte e fez um buquê para ela mesma, imitando a noiva.

O segundo ato do show foi sua fascinação pela Branca de Neve, digo, a noiva. A menina passou o casamento inteiro completamente hipnotizada pela mesma. Não tirava os olhos dela, a seguia para onde fosse, e apaixonada dava a mãozinha para ela e não queria largar. Da igreja até a festa fomos de ônibus, e ela passou a viagem inteira berrando que queria ver a B.d.N.!

Mas isso me preocupa. Meninas gostarem de princesa é meio que uma lavagem cerebral cultural criada por nós mesmos, os pais. Meu marido um dia inventou de chegar de uma viagem com um daqueles dvds de princesa. A partir daí comecei a notar como os estímulos estão em todos os lugares, nas estampas das roupas, nos desenhos dos brinquedos, naqueles vestidinhos de fantasia que todas as amiguinhas já têm e na televisão. Desde pequenas as meninas aprendem que tem que ser femininas, gostar de rosas, serem boazinhas e lindas, de cabelo comprido, magrinhas e roupas encantadoras.

Será que é esse o exemplo ideal para as meninas? Até hoje só fui mãe de menino, então esse universo rosa é novo para mim. Quando pequena eu adorava brincar com os meninos, competir com eles (e ganhava sempre, ao menos na natação e na arte de dar um fora quando me provocavam – era bom demais). Mas aprendi certas coisas de menina que me fazem um pouco fraca às vezes, achando que certas coisas são de homem.

Acho que às vezes ser uma menininha mais “macha” tem suas vantagens. Então já sei o que vou fazer: nada de ballet, hello kitty e festa de princesa, aniversário em casa se comemora com a liga da justiça e esporte é karatê!

terça-feira, 10 de abril de 2012

Quanto tempo falta pra daqui a pouquinho?

Na semana passada estive na escola da Anita para aquela primeira reunião com os pais. Duas coisas me chamaram a atenção: a postura da professora em relação ao combate da ansiedade das crianças e alguns comentários idiotas dos pais, do tipo: meu filho já perdeu todos os lápizes e eu repus, se ele não puder ir ao banheiro é capaz de mijar no pé da profe e por aí vai.

Hoje vou falar do primeiro caso. A situação era a seguinte: a professora de música não deixa as crianças fazerem xixi. Algumas mães pediram à tutora oficial que levasse todos ao banheiro antes da aula de música, que antecede o recreio, como a professora do ano passado fazia.

A nova professora explicou que se ela fizesse esta "combinação", as crianças passariam mais da metade da aula só falando nisso, perguntando sobre a hora de ir ao banheiro, enfim, completamente ansiosas e dispersas. Eis o X da questão (que bom que a professora sacou isso), as crianças de hoje não funcionam nesta lógica de recompensa que nós fomos criados. O "se você se comportar agora, ganha tal coisa" não cola com elas. Elas só vivem o agora.

Se na segunda-feira mencionarmos que viajaremos no próximo final de semana, pronto, tá feito o estrago. Elas vão passar a semana toda perguntando quantos dias faltam e se falta muito. Exatamente como fazem com o aniversário, Natal e outras datas.

Casualmente meu irmão comentou comigo que uma de suas filhas, que também tem 7 anos, está tendo crises terríveis de ansiedade. O quanto tempo falta de hoje pode virar insegurança e paranoia na semana que vem, porque elas não conseguem enxergar o tempo como linear nem tampouco entender que a morosidade e o lento encadeamento dos fatos é normal. Talvez porque nos desenhos animados não seja, mas eu, sinceramente não sei a causa ou as causas exatas deste fenômeno.

O que eu sei é a forma que eu criei para lidar com a minha filha. Uma coisa por vez. Se agora vamos fazer o tema, faço disso um grande momento. Porque, se eu apresentar uma sequência do tipo tema- descer pra brincar-almoçar fora, ela vai ficar tão ansiosa pra descer, ou pra sair pra almoçar que jamais conseguirá concluir o tema em tempo de brincar, por exemplo.